Por Tuca Munhoz *

Quem está precisando de ajuda?

Fui um dia desses, logo cedo, à agência dos correios da Rua Martin Francisco para postar para uma amiga do Rio de Janeiro o livro 30 Anos do Ano internacional das Pessoas Deficientes.

Resolvi ir por um caminho novo: o lado par da Rua das Palmeiras. Caminho que utilizo muito pouco, já que a acessibilidade desse lado da rua era muito ruim. Agora, com a instalação de guias rebaixadas em algumas esquinas a acessibilidade está apenas ruim, pois o estado de conservação das calçadas é lamentável.

Um dos piores trechos é o da entrada da garagem da Rádio CBN, onde, talvez pelo próprio abandono do local, vários moradores de rua tomam por quarto de dormir (e banheiro).

Ao passar por lá uma dessas pessoas, um homem jovem, em lamentável e triste condição, gemia e implorava por um prato de comida.

Passei alguns metros, como tantas vezes passo por tantos outros que me pedem. Não resisti, porém, às suas súplicas, voltei e coloquei em sua mão uma moeda de um Real. Ele olhou para mim, primeiro para meus olhos, depois para minha cadeira de rodas e perguntou: o senhor precisa de ajuda?

Moral da história (preconceituosa): todas as pessoas com deficiência precisam de ajuda.

Todos são amigos

Fiz amizade com o Manoel, um contumaz, fiel e ébrio frequentador do bar aqui em frente do meu prédio.

Quase todos os dias o vejo sentado sempre à mesma mesa na calçada. Às vezes estou lá com ele bebendo uma também.

Ontem, ao chegar de algum compromisso vi que ele estava lá. Subi, deixei a papelada sobre a mesa, dei meia dúzia de beijos na patroa e fui para minha cerveja em companhia do Manoel.

Chegando ao bar não o encontrei na mesa da calçada. Entrei e perguntei a um funcionário pelo meu amigo, dizendo que eu o tinha visto numa mesa do lado de fora, agorinha mesmo.

Disse-me o funcionário: “Ele está lá, está lá fora, sim.” Voltei para fora e vistoriei todas as mesas, enroscando minha cadeira de rodas em algumas. Não o encontrei.

Retornei ao funcionário que insistiu e decidiu me acompanhar. Fomos até a última mesa na ponta da calçada, onde estavam dois homens, ilustres desconhecidos, um deles em cadeira de rodas, para o qual o funcionário que me acompanhava apontou e disse: “Olha o seu amigo aí.”

Moral da história (preconceituosa): todas as pessoas com deficiência são amigas.

Somos parecidos?

Fui à casa do meu amigo Sacha, que, como eu, também usa cadeira de rodas motorizada.

Ao ir embora, estava parado na esquina para atravessar, quando vi surgir um senhor oferecendo-se para parar o trânsito para que eu atravessasse. Eu lhe disse:

— Não é necessário, pode deixar que atravesso sozinho, o farol vai fechar logo, aí então eu atravesso.

Ele não se convenceu, foi indo para o meio da rua com os braços levantados, enquanto gritava:

— Vem Seu Sacha, vem Seu Sacha…

Moral da história (preconceituosa): todas as pessoas com deficiência são iguais.

* Tuca Munhoz é presidente do Instituto MID – para a participação social das pessoas com deficiência