Tv colorida com chuviscos.

Paulo Romeu Filho – Blog da audiodescrição

Aqueles que acompanharam a novela América, da Rede Globo, provavelmente devem se lembrar da última cena do último capítulo: uma festa com a participação da autora, dos autores, de toda a equipe de produção e, principalmente, de pessoas com todos os tipos de deficiência.

Suponho que a intenção desta cena derradeira foi sintetizar e deixar na mente dos espectadores um dos objetivos da autora: levar para milhões de lares, no horário mais nobre da televisão brasileira e de diversos países para os quais nossas novelas são exportadas, uma pequena parte das dificuldades que as pessoas com deficiência enfrentam em seu dia-a-dia e, mostrar de que forma a sociedade, com pequenos ajustes, pode, ou deve, permitir e facilitar a plena inclusão destas pessoas.

Mas, falar é fácil, fazer nem sempre… pois, durante praticamente todo o período de exibição da novela, pessoas com deficiência insistiram junto a direção da emissora para que demonstrasse, na prática, a Responsabilidade Social que propala em seus programas.

Pessoas cegas pediam que fosse inserida a audiodescrição, uma locução transmitida através do Programa Secundário de Áudio (SAP) para descrever as cenas sem diálogos, só com uma música de fundo, que não conseguiam compreender pela falta da visão; pessoas surdas pediam que fossem inseridas as legendas de texto, através do closed Caption(CC), para que fossem transcritas as falas que não conseguiam ouvir; pessoas com deficiência intelectual pediam que fossem dubladas as falas dos personagens americanos porque, uma parte deles, não conseguiu se alfabetizar ou não tem a fluência necessária para ler as legendas de tradução.

Argumentos não faltaram: o Decreto Federal 5296 de dezembro de 2004 e a norma técnica NBR 15290 – Acessibilidade em Comunicação na Televisão que foi recentemente publicada pela Associação Brasileira de Normas Técnicas ABNT, são documentos que contemplam e tornam obrigatória a aplicação de recursos na programação da televisão brasileira visando torná-la acessível para as pessoas com deficiência.

Infelizmente, nenhum destes recursos foi inserido na novela América, mas, qual não foi a surpresa quando, um dia antes do início de sua nova novela, a Globo publicou anúncio de meia página no jornal, informando os espectadores surdos que Belíssima seria produzida com o closed Caption.

Parabenizamos a Rede Globo pela iniciativa, que esperamos seja brevemente copiada pelas demais emissoras, incluindo as TVs por assinatura, mas não nos daremos por satisfeitos até que 100% da programação de todas as emissoras seja acessível para as pessoas com todos os tipos de deficiência, inclusive cegos e pessoas com deficiência intelectual.

Nota do Autor:

Este artigo foi escrito quatro anos atrás, a pedido do Jornal da AME.

Infelizmente, as emissoras brasileiras de televisão aberta, com a conivência do Ministério das comunicações, continuam apenas alardeando um “marketing de responsabilidade social”, ao invés de efetivamente praticá-lo na programação que veiculam, no que se refere ao recurso de acessibilidade da audiodescrição, importante para pessoas cegas, deficientes intelectuais, disléxicos, idosos.

Desde América, praticamente todas as novelas produzidas pela Rede Globo apresentam algum personagem com deficiência, outras emissoras apresentam documentários e programas especiais sobre ou com pessoas com deficiência, se o uso da imagem das pessoas com deficiência aumenta a audiência das emissoras, certamente esta audiência aumentará ainda mais quando todos os programas forem veiculados com os recursos de acessibilidade disponíveis.

Como disse quatro anos atrás, não nos demos por satisfeitos e não nos daremos até que nosso direito a uma televisão com acessibilidade seja integralmente respeitado.