Apenas 2% dos jovens brasileiros se dizem interessados em seguir a carreira de professor. O dado é de um levantamento feito pela Fundação Carlos Chagas, a pedido da Fundação Victor Civita, com 1.500 estudantes de ensino médio de todo o país. O objetivo do estudo era medir a atratividade da carreira docente, que a contar pelos resultados não anda atraindo muita admiração. Enquanto carreiras como Medicina, Direito ou Engenharia estão no topo do ranking das mais procuradas, o curso de Pedagogia ocupa apenas a 36.ª posição em uma lista de 66 profissões preferidas pelos vestibulandos.

Os motivos para o desinteresse vão desde a pouca afinidade com a profissão, passando pelo desestímulo da família e claro a falta de perspectiva com a baixa remuneração.

Na percepção dos estudantes, ser professor significa trabalhar muito, ser mal remunerado e ter praticamente nenhum reconhecimento social.

O estudo confirmou também uma tendência que já vem sendo observada nas últimas décadas. Com a falta de interesse de alunos de classe média nos cursos de Pedagogia, as vagas vem sendo preenchidas por estudantes de renda mais baixa, na maioria das vezes provenientes de escolas públicas e que em alguns casos apresentam desempenho ruim nos estudos. De acordo com a pesquisa, 87% dos jovens que manifestaram a intenção de se tornar professores eram do ensino público. Além disso, o interesse pela profissão parece ser inversamente proporcional ao grau de instrução dos pais, ou seja, quanto mais estudo tem os pais, menos os filhos demonstram interesse pela docência.

Na opinião da professora e doutora em educação, Regina Maria Michelotto, para entender esses comportamentos é preciso uma visão histórica. “Até meados do século XX o professor era visto com prestígio, era um profissional valorizado cujo salário permitia uma vida digna. Com uma mudança social e econômica, a profissão vai perdendo status para outras e o jovem que antes escolhia a carreira com base em uma visão humanista e levando em conta a realização pessoal passa a decidir de acordo com o mercado”, explica. Para ela, o fato de alunos de renda menor estarem ocupando essa lacuna deixada pela classe média tem vantagens e desvantagens. Por um lado, esses jovens encontram uma oportunidade de ingressar no ensino superior e por conhecerem melhor a realidade de áreas mais pobres podem desenvolver um trabalho mais próximo das comunidades. Por outro, há o agravante de muitos escolherem a profissão não por vocação, mas sim pensando na baixa concorrência no vestibular. “Esse é um retrato da imensa desigualdade social no Brasil. O que resta para o aluno da escola pública são os cursos de menor concorrência”, concorda a coordenadora de ensino superior da Secretaria de Estado da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, Sônia Adum.

Nas universidades públicas do Paraná, o perfil dos estudantes que prestam o vestibular para o curso de Pedagogia é o mesmo do retratado na pesquisa nacional. Enquanto os candidados dos cursos mais visados, como Medicina e Direito, são de família com renda mais alta, estudaram em colégios particulares e frequentaram cursinhos preparatórios, os estudantes inscritos em Pedagogia em geral são provenientes de escolas públicas, pertencem a famílias mais humildes e sequer frequentaram um cursinho.

Nem a própria estudante Luiza Paula Michelotti sabe explicar ao certo porque marcou a opção Pedagogia no vestibular. Concluindo o último ano da graduação na Universidade Federal do Paraná, ela que chegou a cursar um semestre de Letras na Pontifícia Universidade Católica do Paraná mas desistiu, já pensa em tentar vestibular novamente. “Acho que vou prestar para desenho gráfico”, conta. Luiza reconhece que não tem interesse em dar aulas e não pretende seguir a carreira de professora. “Desde que entrei penso em desistir, mas aí fui levando. Fui fazer Pedagogia porque minha irmã também ia tentar e eu não sabia ao certo o que queria, tentei e passei”, admite.

Exemplo

Grande parte dos alunos ouvidos na pesquisa afirmou também que se sente desmotivada em seguir a carreira docente por presenciar as dificuldades que seus professores enfrentam em sala de aula. A imagem que os próprios professores passam da profissão tem influência sobre a opinião dos jovens, ou seja, boa vivência na escola favorece uma aproximação com a ideia de ser professor. “O exemplo é fundamental, se o aluno vê o professor desmotivado, chegando na sala de aula já com uma postura derrotada, é claro que ele não vai querer isso para si próprio. Claro que a remuneração é importante, mas é preciso trabalhar também com a auto estima desses professores, com a formação, para que eles se sintam valorizados e isso se reflita em sala de aula despertando nos jovens a admiração pela profissão”, defende Sônia.
Insatisfação

Estudante nem pensa em dar aulas

Hélio Strassacapa, Jornal de Maringá Online

O caso da estudante Ana Beatriz Britto Castilho, de 19 anos, é bastante coerente com o perfil traçado pela pesquisa. Cursando o segundo ano de Pedagogia na Universidade Estadual de Maringá (UEM), para ela esse deve ser o último contato com o ambiente da educação. “Eu não tenho um pingo de vontade de dar aula”, afirmou. Vinda de colégio público, Ana já conhecia bem o que iria enfrentar se optasse pelo magistério. “O professor de escola pública reclama muito do salário e das condições de trabalho, e isso desmotiva os estudantes. Eu tenho na família professores e me assusto com a realidade. Eu não aconselho ninguém a se tornar professor”, enfatizou.

Para Ana, apenas os colegas mais velhos e que já atuam com o ensino infantil buscam o curso de Pedagogia para essa finalidade. Os demais percebem outras oportunidades que a graduação oferece e não demonstram interesse pelo magistério. Esse é o caso de Ana, que pretende trabalhar na área hospitalar.

Sua recusa pelo magistério já é anterior à entrada na universidade. Ela já havia prestado três vestibulares para outras graduações, mas não passou em nenhum. “Escolhi (Pedagogia) porque era pouco concorrido”, confessa.
De família

Profissão e realização pessoal

Na contramão das estatísticas, a estudante Cecília Pereira Kloster, 19, vê na profissão de professor a realização pessoal.

De família de classe média, a jovem estudou a vida toda em colégios particulares. Boa aluna na escola, ela teria nota para entrar em qualquer curso na Universidade Federal do Paraná, mas optou por pedagogia. Filha de professores, cresceu vendo o exemplo do pai, um entusiasta da profissão, segundo ela.

“Minha motivação e o gosto por ensinar veio do exemplo dele”, conta. Quando estava no ensino médio, Cecília chegou a pensar em estudar Engenharia, mas depois se convenceu de que sua vocação é estar em contato com pessoas. “Despertar em alguém o desejo de aprender é algo que não tem preço”, defende.

Cursando o segundo ano, ela já fez estágio e tem planos para a carreira. Não pensa em parar de estudar ao terminar a graduação. Quer se especializar e investir na formação.

Com opinião e visão crítica, ela lamenta o estigma carregado pelos estudantes de Pedagogia. “Há um preconceito por parte dos estudantes de outros cursos, como se fôssemos menos capazes”, diz.

O preconceito também é citado pela estudante Patrícia Oliveira Souza, 18 anos, que cursa o primeiro ano de Pedagogia na UFPR. Patrícia estudou a vida inteira em escola pública e não frequentou cursinho preparatório para o vestibular.

Ao contrário da maioria de muitos colegas, ela defende a profissão e diz que a escolha foi baseada na vocação. “Sempre sonhei em ser professora. Gosto de estar com as crianças”, conta. Patrícia reconhece que a profissão deveria ser mais valorizada, mas acredita que isso também depende de cada profissional. “Se você não se acomoda, investe na sua formação, procura se especializar você vai ser reconhecido”, afirma.

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Fonte: Gazeta do Povo